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RAFAELA GARCIA LOPES PEREIRA é pesquisadora em migrações forçadas e advogada no ramo do direito trabalhista, com atuação também nas áreas de direito migratório e direitos humanos. Possui pós-gradução em direito internacional pela UNESA e atualmente cursa mestrado em Direitos Humanos pela Universidade Federal de Goiás (UFG) na linha de pesquisa em direito internacional dos direitos humanos com enfoque em migrações forçadas.

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21
Agosto 
2024

Moro num país tropical: Brasil à frente dos deslocamentos internos impulsionados pelas mudanças climáticas

 

O país tropical e “bonito por natureza” de Jorge Ben Jor lidera o continente americano em número de deslocados climáticos. De acordo com o relatório global divulgado em 14 de maio de 2023 pelo Centro de Monitoramento de Deslocamento Interno de Genebra (IDMC), o Brasil registrou um aumento significativo nos deslocamentos internos, em grande parte devido aos impactos das mudanças climáticas.


A Organização das Nações Unidas (ONU) aponta que os desastres ambientais têm gerado três vezes mais deslocamentos do que os causados por conflitos e violência. No ano passado, aproximadamente 750 mil deslocamentos internos foram registrados no Brasil, com destaque para as regiões Norte e Nordeste, especialmente nos Estados do Pará, Amazonas e Maranhão.

 

Além disso, o relatório de 2023 de Genebra aponta que o Estado do Rio Grande do Sul havia registrado 180 mil deslocamentos internos.


Os principais fatores que contribuem para o deslocamento de pessoas incluem a escassez de água, a redução da produtividade agrícola, secas, elevação do nível do mar e eventos climáticos extremos, como tempestades, inundações, calor excessivo, conforme a pesquisa realizada pelo Banco Mundial.
 

No contexto brasileiro, a principal causa de deslocamento identificada pela Organização Internacional para Migrações (OIM) é a ocorrência de enchentes. Esses movimentos migratórios internos, que englobam deslocamentos entre áreas rurais e urbanas, assim como migrações dentro das próprias áreas urbanas, geram uma série de problemas socioambientais, como escassez de alimentos, falta de moradia adequada e ausência de saneamento básico, sobrecarregando as já precárias infraestruturas nas áreas de destino.


Embora as previsões meteorológicas para 2050 ainda estejam em discussão, muitos eventos climáticos estão ocorrendo antes do esperado. Pesquisadores acadêmicos ressaltam a importância de uma nova agenda pública e acadêmica e sugerem que um diálogo mais estreito entre esses dois setores pode ser altamente benéfico.


A tendência para os próximos anos é um aumento no número de pessoas deslocadas por desastres, à medida que a frequência, duração e intensidade dos perigos naturais se acentuem devido às mudanças climáticas. Em resposta a essa realidade, o Banco Mundial recomenda que os países reduzam as emissões globais e se empenhem em cumprir as metas estabelecidas no Acordo de Paris.


Ademais, os países que participam da Agenda 2030 devem adotar medidas urgentes para enfrentar a mudança climática e seus impactos, conforme estipulado no plano de ação global. Somando-se a isso, investir em educação ambiental, promover o engajamento das comunidades, implementar políticas públicas estratégicas, estabelecer parcerias entre governos, sociedade civil e setor privado são abordagens fundamentais para mitigar os efeitos das mudanças climáticas e avançar na construção de um mundo sustentável.


Referências:


Anunciação, Silvio. Brasil é líder em deslocamentos internos por desastres
climáticos. Disponível em: https://jornal.unicamp.br/audio/2024/05/17/brasil-elider-
em-deslocamentos-internos-por-desastresclimaticos/#:~:
text=No%20continente%20americano%2C%20o%20Brasil,refere
ntes%20ao%20ano%20de%202023.


Marques, Luiz. O relatório da Organização Meteorológica Mundial. Um rápido
comentário. Disponível em: https://jornal.unicamp.br/artigo/2024/03/26/luizmarques/
o-relatorio-da-organizacao-meteorologica-mundial-um-rapidocomentario/
Paz, Eduarda. Deslocamentos migratórios forçados: relatório do Banco Mundial
aponta que 216 milhões de pessoas poderão ser forçadas a saírem de seus
países até 2050 para fugir de eventos climáticos extremos. Disponível em:
https://www.ufsm.br/midias/arco/deslocamentos-migratorios-forcados.


Pontes, Paula Penedo. Estudo projeta redução de 26% na produção de etanol
em razão de alterações na frequência das chuvas. Disponível em:
https://jornal.unicamp.br/edicao/710/mudancas-climaticas-podem-afetarproducao-
de-cana-conclui-pesquisa/
ONU. Brasil lidera deslocamentos internos por desastres nas Américas.
Disponível em:
https://news.un.org/pt/story/2024/05/1831636#:~:text=Nos%20pr%C3%B3ximo
s%20anos%2C%20espera%2Dse,no%20contexto%20das%20mudan%C3%A7
as%20clim%C3%A1ticas.


Valeri, Júlia. No Brasil, desastres socioambientais e violência impulsionam as
migrações internas. Disponível em: https://jornal.usp.br/radio-usp/atualidadesbrasil-
e-o-pais-com-mais-deslocamentos-internos-das-americas/

Imagem disponível em: https://www.wwf.org.br/natureza_brasileira/reducao_de_impactos2/clima/politicas_de_clima/brasil_mudancas_climaticas/

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15 
Maio 
2024

Parem os barcos: o plano do Reino Unido posto em ação contra migrantes forçados em situação irregular e os impactos ao sistema internacional de proteção dos refugiados

O canal da Mancha situado entre o norte da França e o sul do Reino Unido representa uma rota vital de ligação entre estes dois países. Contudo, essa passagem se transformou em um caminho perigoso para indivíduos em deslocamento forçado, muitas vezes resultando em tragédias humanas.

A chegada de pequenas embarcações não autorizadas e precárias repletas de migrantes em situação irregular oriundos principalmente do norte da África e Oriente Médio na ilha britânica, já que a via terrestre é quase impossível, ante a fiscalização mais severa, denota uma situação humanitária crítica em plena expansão.

De acordo com o ACNUR, em 2022, um recorde de 45.755 pessoas chegaram ao Reino Unido através do Canal da Mancha. No ano seguinte, em 2023, mais de 12 mil entraram, mantendo uma taxa de entrada semelhante à do ano anterior. Embora haja diversas razões que motivam a migração, a preferência pela Inglaterra como destino ressoa principalmente devido à fluência linguística e na expectativa de uma pronta inserção no mercado de trabalho, mesmo em meio à irregularidade legal.

Entretanto, tal percepção revela-se um tanto equivocada diante das mudanças provocadas, principalmente pela saída do Reino Unido da União Europeia (UE), visto que desencadeou uma redefinição severa das políticas de migração, dificultando inclusive a concessão de refúgio. Esta mudança não só reforça, como também acentua a nociva narrativa que estigmatiza os imigrantes como uma ameaça.

Por ocasião, a retórica “stop the boats” ou “parem os barcos” reflete a abordagem desumana e anti-imigração adotada pelo primeiro-ministro britânico - Rishi Sunak, que prioriza a deportação de solicitantes de refugiados em situação irregular em vez de lidar com as causas subjacentes da migração.

Em meio as críticas pela comunidade internacional, recentemente, o Parlamento do Reino Unido não só aprovou como colocou em prática uma draconiana lei para enviar solicitantes de refúgio indocumentados para Ruanda um dos países mais pobre do mundo.

O sentido do acordo bilateral realizado entre os respectivos países é minimizar a entrada de migrantes sem documentos, especialmente aqueles que chegam ao Reino Unido em embarcações não regulamentadas pelo Canal da Mancha.

Esse tipo de estratégia política não só aumenta a vulnerabilidade dos migrantes e dos solicitantes de refúgio, mas os sujeitam a riscos extremos, desrespeitando flagrantemente o direito internacional dos refugiados e o pleno exercício dos direitos humanos. Afronta ainda a Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH), prejudicando os esforços para assegurar a dignidade das pessoas em situação de deslocamento forçado.

Além do mais, tal comportamento cria um precedente preocupante que pode influenciar outros países a aderirem posições semelhantes, comprometendo inclusive com os mecanismos internacionais da fraternidade e da solidariedade humanitária.

É importante ressaltar que a situação irregular de uma pessoa em deslocamento forçado não a impede de buscar refúgio no país de destino. A Convenção de 1951 estabelece claramente o direito dos refugiados de procurar asilo, mesmo que sua entrada ocorra de maneira irregular.

Uma segurança jurídica internacional que tem sido relativizada por alguns países, como o Reino Unido, demonstra a hipocrisia daqueles que, em algum momento de sua história, já foram dependentes dela. Outrora revela tamanha indiferença com o próximo em prol dos interesses políticos pessoais ou partidários.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ACNUR. Projeto de Lei de Migração Ilegal do Reino Unido: ACNUR e Escritório de Direitos Humanos da ONU alertam sobre o profundo impacto nos direitos humanos e no sistema internacional de proteção a refugiados. Disponível em: https://www.acnur.org/portugues/2023/07/21/projeto-de-lei-de-migracao-ilegal-do-reino-unido-agencia-da-onu-para-refugiados-e-escritorio-de-direitos-humanos-da-onu-alertam-sobre-o-profundo-impacto-nos-direitos-humanos-e-no-sistema-internaciona/. Acesso em 10 mai. 2024.

CONVENÇÃO RELATIVA AO ESTATUTO DOS REFUGIADOS. Disponível em: https://www.acnur.org/fileadmin/Documentos/portugues/BDL/Convencao_relativa_ao_Estatuto_dos_Refugiados.pdf. Acesso em 10 mai. 2024.

Imagem disponível em: https://news.un.org/pt/story/2016/04/1548241. Acesso em 15 mai. 2024. 

MIGRAMUNDO. Canal da Mancha vira foco de tensão na Europa sobre migrantes e refugiados.

Disponível em: https://migramundo.com/como-as-tendencias-securitarias-modificam-as-rotas-de-imigracao-da-franca-para-o-reino-unido-via-canal-da-mancha/. Acesso em 10 mai. 2024.

MIGRAMUNDO. Como as tendências securitárias modificam as rotas de imigração da França para o Reino Unido via Canal da Mancha. Disponível em: https://migramundo.com/como-as-tendencias-securitarias-modificam-as-rotas-de-imigracao-da-franca-para-o-reino-unido-via-canal-da-mancha/. Acesso em 10 mai. 2024.

 

WEISZ, Shirlei Amaro. Além das fronteiras: navegando na interação entre o brexit e a crise migratória na europa. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/399557/navegando-na-interacao-entre-o-brexit-e-a-crise-migratoria-na-europa. Acesso em 11 mai. 2024.

 

Riegert, Beirnd. UE endurece política de asilo e quer deportar mais. Disponível em: https://dw.com/pt-br/ue-endurece-pol%C3%Adtica-de-asilo-e-quer-deportar-mais/a-68791097. Acesso em 11 de mai. 2024.

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