Maria Célia Ferraz Roberto da Silveira
Mestranda em Direito pela Universidade Candido Mendes (2022), pós-graduada em Direito Processual Civil pela Universidade Candido Mendes (2010) e graduada pela mesma instituição (2007). Professora da Universidade do Grande Rio - UNIGRANRIO. Advogada. Membro da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio de Janeiro, Subseção da Ilha do Governador (2022). Integrante do Grupo de Pesquisa em Direitos Humanos, Cidadania e Estado da Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa (PROPEP) da Universidade do Grande Rio, desde 2022. Membro da International Studies Association desde 2023. Integrante do Laboratório de Estudos e Pesquisas Avançadas em Direito Internacional Ambiental (LEPADIA/UFRJ).

31
Julho
2024
As mudanças climáticas como ameaça global
As mudanças climáticas são um dos maiores desafios enfrentados pela humanidade no século XXI. A intensificação de fenômenos climáticos extremos, o aumento das temperaturas globais e a elevação do nível do mar são evidências claras de que o clima da Terra está se transformando de maneira acelerada e sem precedentes. Este estudo tem como objetivo identificar os fundamentos científicos das mudanças climáticas, analisar as ameaças provenientes dessas alterações, como os prejuízos econômicos, a escassez de recursos e alimentos, e a perda de territórios.
Para compreender os fundamentos científicos das mudanças climáticas, é crucial abordar o papel dos gases de efeito estufa (GEE) na regulação da temperatura terrestre. Segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), "as concentrações atmosféricas de dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O) aumentaram para níveis sem precedentes em pelo menos 800.000 anos" (IPCC, 2021). Esses gases aprisionam calor na atmosfera, resultando no aquecimento global.
As ameaças provenientes das mudanças climáticas são variadas e interconectadas. No âmbito econômico, eventos climáticos extremos levam à destruição de infraestrutura, afetando negativamente setores como agricultura e turismo. De acordo com um relatório do Banco Mundial (2017), "as perdas econômicas anuais devido às catástrofes naturais podem chegar a US$ 520 bilhões". Além disso, as alterações no padrão climático comprometem a segurança alimentar ao afetar diretamente a produtividade agrícola.
A escassez de recursos hídricos é outra consequência crítica das mudanças climáticas. O aumento das temperaturas provoca derretimento de geleiras e reduz a disponibilidade de água potável em várias regiões do mundo. Conforme destacado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), "até 2050, estima-se que pelo menos uma em cada quatro pessoas viverá em um país afetado por escassez crônica ou recorrente de água doce" (OMS, 2018).
Além disso, as mudanças climáticas representam uma ameaça significativa à biodiversidade global. A perda de habitats naturais devido ao aumento do nível do mar e à destruição causada por incêndios florestais coloca inúmeras espécies em risco de extinção. Segundo estudos publicados na revista Nature Climate Change (Warren et al., 2018), "mais de um milhão de espécies estão ameaçadas por extinção nas próximas décadas devido às alterações nos seus habitats naturais causadas pelas mudanças climáticas".
As mudanças climáticas têm sido amplamente reconhecidas como uma das maiores ameaças globais contemporâneas, afetando diretamente a biodiversidade, a economia e a saúde humana. Este trabalho tem por objetivo identificar os fundamentos científicos das mudanças climáticas e analisar as ameaças provenientes dessas alterações no clima, tais como os prejuízos econômicos, a escassez de recursos e alimentos, e a perda de territórios.
Em primeiro lugar, é fundamental entender os fundamentos científicos das mudanças climáticas. De acordo com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), há um consenso de que o aumento das concentrações de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera, principalmente devido às atividades humanas como a queima de combustíveis fósseis e o desmatamento, é o principal motor das mudanças climáticas (IPCC, 2021). Estudos recentes indicam que as temperaturas médias globais já aumentaram cerca de 1,1°C desde o período pré-industrial, resultando em consequências significativas para os ecossistemas naturais e as sociedades humanas.
A análise dos impactos econômicos das mudanças climáticas revela uma série de desafios substanciais. O Banco Mundial estima que até 2030 os custos relacionados às mudanças climáticas podem levar até 100 milhões de pessoas à pobreza extrema devido à perda de produtividade agrícola e ao aumento dos preços dos alimentos (Banco Mundial, 2022). Além disso, eventos meteorológicos extremos associados ao aquecimento global têm causado danos significativos à infraestrutura urbana e rural, aumentando os custos com seguros e reparações.
A escassez de recursos hídricos e alimentares também constitui uma ameaça significativa decorrente das alterações no clima. De acordo com um relatório da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), projeta-se que as mudanças nos padrões pluviométricos e o aumento da frequência de eventos extremos como secas prolongadas podem comprometer severamente a produção agrícola mundial (FAO, 2021). Isso não só afeta diretamente os agricultores mas também tem implicações profundas para a segurança alimentar global.
Outro aspecto crítico é a perda territorial resultante da elevação do nível do mar. Pesquisas indicam que se as tendências atuais continuarem, muitas áreas costeiras densamente povoadas poderão ser submersas até o fim do século XXI (Nicholls et al., 2018). Esta mudança forçaria milhões de pessoas ao deslocamento involuntário, exacerbando crises migratórias já existentes.
Por fim, é crucial abordar como essas alterações impactam negativamente a biodiversidade. Segundo um estudo publicado na revista Nature Climate Change, aproximadamente 50% das espécies vegetais podem perder mais da metade do seu habitat climático até 2100 se as emissões de GEE não forem controladas (Warren et al., 2018).
REFERÊNCIAS
Banco Mundial. Unbreakable: Building the Resilience of the Poor in the Face of Natural Disasters. Washington DC: World Bank Group; 2017.
Banco Mundial. (2022). Climate Change and Poverty: An Analytical Framework. Washington D.C.: The World Bank.
FAO. (2021). "The State of Food and Agriculture: Climate Change and Food Security." Rome: Food and Agriculture Organization of the United Nations.
IPCC (2021). Climate Change 2021: The Physical Science Basis. Contribution of Working Group I to the Sixth Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change.
Nicholls et al. (2018). "Sea-level rise and its possible impacts given a ‘beyond two degree world’," Philosophical Transactions of the Royal Society A: Mathematical, Physical and Engineering Sciences.
Warren et al. (2018). "The projected effect on insects is especially pronounced," Nature Climate Change.

17
Abril
2024
A Responsabilidade Civil por Danos Ambientais à luz da recente decisão da 2ª Turma do
STJ
A recente decisão da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do REsp 2065347/PE, reafirmou que a responsabilidade civil das empresas por danos ambientais independe da comprovação do dano. Isto significa que a responsabilidade dos poluidores em relação ao meio ambiente é objetiva. Neste estudo, exploraremos os fundamentos dessa decisão, analisando os princípios ambientais, as bases legais e os aspectos relacionados à responsabilidade civil ambiental.
A decisão do STJ baseia-se na teoria do risco do empreendimento, que implica que o poluidor deve arcar com os riscos inerentes à sua atividade e, mesmo na ausência de prova técnica específica, como ocorreu no caso analisado, a responsabilidade pelo dano ambiental é imputada ao poluidor. Essa abordagem reconhece que, ao obter lucros com suas operações, o poluidor também deve assumir os ônus dos impactos ambientais.
Em seu voto, o relator, Ministro Francisco Falcão, citou princípios do direito ambiental que embasariam a sua decisão. Neste sentido, um dos princípios mencionados na decisão foi o princípio da prevenção, segundo o qual é necessário evitar a ocorrência de danos ambientais sempre que possível, estabelecendo que a proteção ambiental deve ser uma prioridade, e que medidas preventivas devem ser adotadas para evitar impactos negativos. O também mencionado princípio da precaução, por sua vez, reconhece que, mesmo na ausência de provas científicas conclusivas, ações devem ser tomadas para evitar danos ambientais, alertando para os riscos desconhecidos e nos incentiva a agir com cautela.
Para Guerra (2023, p. 234), a principal diferença entre estes princípios é que a prevenção busca antecipar e evitar danos ambientais por meio da adoção de medidas preventivas baseadas em conhecimentos científicos e tecnológicos disponíveis, reconhecendo-se a existência de um perigo concreto, enquanto que o princípio da precaução se fundamenta na existência de um potencial lesivo ao meio ambiente, identificando-se um perigo abstrato.
A decisão do Superior Tribunal de Justiça em análise também mencionou o princípio do poluidor-pagador como fundamental para a responsabilização civil ambiental, estabelecendo que aquele que causa a poluição deve arcar com os custos de reparação e compensação. A Lei 6.938/1981 reforça esse princípio, em seu artigo 4º, VII, determinando que os poluidores são responsáveis pela indenização ou reparação dos danos ambientais, independentemente de culpa.
Na mesma linha, o artigo 225 da Constituição Federal estabelece que a proteção ao meio ambiente é dever de todos, não apenas do poder público, consagrando a ideia de que a preservação ambiental é uma responsabilidade compartilhada.
A Lei 6.938/1981, em seu artigo 14, §1º, reforça a responsabilidade dos poluidores, ao estabelecer que a obrigação de reparar o dano ambiental independe da existência de culpa, alinhando-se à interpretação dada ao princípio do poluidor-pagador pelo Tribunal da Cidadania1. Em outras palavras, mesmo na ausência de culpa comprovada, o poluidor é legalmente obrigado a compensar os prejuízos causados ao meio ambiente e a terceiros decorrentes de suas ações.
A decisão do STJ no REsp 2065347/PE, ao reconhecer e aplicar a responsabilidade civil das empresas por danos ambientais de forma objetiva; isto é; independentemente da comprovação do dano, representa um importante avanço em matéria ambiental, eis que garante a proteção efetiva do meio ambiente e a prevenção de danos irreparáveis, reforçando a importância de considerar os impactos ambientais mesmo quando não há provas concretas de prejuízo.
Assim, a decisão da 2ª Turma do STJ é um passo significativo na busca pelo equilíbrio entre desenvolvimento econômico e preservação ambiental, lembrando que a responsabilidade ambiental não é apenas uma questão legal, mas um compromisso moral com as gerações presentes e futuras, um dever compartilhado por todos.
REFERÊNCIA
BRASIL. Lei 6.938/1981: Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente. 1981.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (2ª Turma). REsp 2065347/PE. Data da Decisão: 15/03/2024.
GUERRA, Sidney. Curso de Direito Ambiental. 5 ed. Rio de Janeiro: Grande Editora, 2023
Imagem disponível em: https://www.verdeghaia.com.br/triplice-responsabilizacao-ambiental/
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1 Neste sentido, o artigo 14, §1º, da Lei 6.938/1981 estabelece a responsabilização por dano ambiental de forma clara e objetiva. Segundo esse dispositivo legal: “Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade.”